Uma saga Indiana

Posted by Cronicas de Bebado on 11:47 in , , , , , , ,

"Aproveitando a transmissão da novela sobre as Maravilhas da India e o Povo Indiano, o Crônicas de Bêbabo resolveu pegar uma carona nesse Sucesso. Divirtam-se"




O Brasil já não tinha mais sentido para mim. Precisava ganhar o mundo. Sou o maior proprietário de churrascaria rodízio e espeto corrido do Brasil e Argentina. Sempre tive um sonho reprimido de conhecer a Índia. Aquele povo tão estranho e curioso sempre despertou meus desejos mais profundos. O que eu poderia encontrar lá? Uma gente hospitaleira e pronta para apreciar um suculento entrecorte de picanha mal-passada, e o que é melhor, pagar por isso.
Minha primeira providencia foi vender minha rede de restaurantes e anunciar a nova vida a minha família. Como foi uma decisão precipitada, vendi meu patrimônio por 1/3 do preço de mercado ao meu principal concorrente. Recebi a metade em cheques e o restante em dividendos a longo prazo de uma empresa chamada “Silva e Silveira’s maquinas de escrever, LP’s, K7 e Betamax distribuidora S/A”. Com a fortuna que eu faria no mercado indiano, com certeza recuperaria tudo em tempo recorde e me tornaria mais rico do que era antes.
Minha família não aprovou a idéia e me chamou de louco. Não perceberam como sou visionário e o que conseguiria fazer em pouco tempo lá, já que descobri que na Índia não há nenhum estabelecimento desse tipo. Como esse povo nunca pensara em explorar esse ramo tão promissor? Bando de otários, esse povo é tão tolinho quanto roubar doce de criança dormindo.
Sempre adorei aquela cor de catuto deles e acho um charme aquelas casinhas com aberturas sem portas no formato de cogumelo. Minha vida já esta escrita. Seria o mais novo milionário da Índia.
Minha família me abandonou. Antes que meus filhos pudessem entrar na justiça e me interditar, dei os cheques das vendas que eram pré-datados para eles calarem a boca e segui meu rumo. Minha mulher confessou que me traia há 20 anos com o zelador de nossa casa de praia e que estava me deixando e indo morar com ele no barraquinho dele no morro do urubu pelado. Detalhe importante: ele era 20 anos mais velho que eu, manco da perna esquerda, olho de vidro e 40 anos mais velho que ela. E o coitado ainda perdeu o pênis na segunda guerra mundial. Acho que ele se vestia muito bem.
Com o dinheiro que restou, comprei 200 cabeças de gado, sendo 180 vacas magras e 20 touros parrudos. Fretei um navio cargueiro, botei a bicharada toda pra dentro e me senti o próprio Noé. 20 dias de viagem passando a pão com alho e miojo enlatado. No meio da viagem, me dei conta que havia esquecido algo. Não comprei ração suficiente para alimentar os bovinos, e a palha que o pessoal do navio havia conseguido em nossa ultima parada estava bichada. Acabei dando minha própria comida para os animaizinhos famintos, que mugiam desesperados. Os touros não agüentaram o tranco. Como eu poderia saber que eles eram intolerantes a alho? Os que sobraram pelo menos já estariam temperados. Mandei que os capachos do navio destrinchassem e salgassem as carnes que pudessem ser aproveitados. Infelizmente, como os desgraçados esqueceram de retirar a carne do cargueiro do navio, as vacas famintas, quando acabou o pão com alho e o miojinho, passaram a se alimentar dos touros mortos e deliciosamente salgados. Quando o pessoal descobriu isso, quis me linchar, pois eu não estava deixando ninguém comer o produto, já que eu esperava utiliza-la quando eu chegasse a índia para fazer carreteiro. Assim o prejuízo não seria tão grande. Mas estava otimista, afinal faltava um dia para chegar ao meu destino. Das 180 vacas, sobraram 90, pois, as mesmas, sedentas por sangue, canibalizaram as demais. Quando cheguei ao porão do navio e vi aquela cena hedionda entrei em desespero. Tenho certeza que uma das vacas me olhava nos olhos e queria me comer.
Cheguei ao meu destino. Aaaahhhhh! que povo maravilhoso. Fui ternamente abraçado por milhares de crianças assim que desci do navio em Bombaim. Estranhamente percebi em seguida que meu passaporte havia sumido.
Procurei então por meu contato na Índia. Antes de sair do Brasil, como sou precavido, já havia deixado tudo preparado. Entrei em contato com um rapaz que anunciava na internet o aluguel de casas na Índia e combinei que ele me esperaria no porto. O nome dele era Orestes. Estranhei a brasilidade dele no telefone. Fiquei 3 dias esperando, dormindo com as vacas no porto. Elas dormindo em cima de mim, pois o pessoal do porto estranhamento não permitiu que eu dormisse em cima delas. Que cultura esquisita.
Passados esses dias, comecei a pensar que havia sido enganado por Orestes. E o pior é que havia depositado antecipadamente o valor de 6 meses de aluguel da kitnete que ele me prometeu na divisa da índia com a Kashemira, numa conta do Banrisul. E olha que eu nunca iria imaginar que havia uma agencia de um Banco Gaúcho na Índia. Para ver como nós gaudérios somos cosmopolitas.
Finalmente Orestes chegou, se desculpou pelo pequeno atraso e me pôs na van para então ir a habitação. Me contara que era filho de Argentino com Árabe. Fiquei me indagando por ele ter a aparência de asiático e estar usando uma camisa do Inter, meu time do coração. Pelo menos tínhamos afinidade, o time.
Tchê-gay as 24:24hs do dia 24 de Dezembro, véspera de natal. O espírito gaudério conspirava ao meu favor. Achei anormal a pouca receptividade pelas pessoas a quem eu desejava Feliz Natal. Nem parece que esse povo é cristão, veja só que absurdo! Será que eles não gostam do Papai Noel. Espera só eu colocar minha roupa de Noel que comprei na minha ultima viajem ao Alaska. Vou fazer Ho-Ho-Ho no ouvidinho de tudo que é criancinha daqui.
Orestes me convenceu que deveria levar todas as vacas na Van conosco. Acho que ele queria economizar o carreto. O difícil foi convence-lo a colocar as 90 vacas amarradas no teto do carro. Não entendi por que ele ficou gritando que era uma heresia o que eu estava fazendo. Agora tenho certeza que ele é como eu. Preocupado com as vaquinhas. Bem coisa de gaudério mesmo, não queria estragar a carne. Ele sabe o valor de uma costela bem preparada.
Fomos seguidos por uma multidão enfurecida, tinha certeza que esse pessoal faminto queria que eu assasse as vaquinhas ali mesmo. Com certeza iria fazer fortuna nesse país. O condutor da van gritou com Orestes. Fiquei sabendo depois que ele queria que eu pagasse os danos causados pelas pedradas e chutes que a multidão esfomeada deu na Van. Se o povo local não gostava dele, o que eu tinha a ver com isso? Ele devia estar com inveja pelo povo querer minhas carnes.
Chegamos finalmente ao meu palácio. Acho que Orestes se enganou, pois só tinha 20 metros quadrados a Kitnet, para mim e as vacas. Nas fotos que ele me mandou, parecia bem maior. Questionei-o sobre aquilo e ele me disse que eu era quem tinha visto as fotos erradas. Falou que eu teria que ter baixado o anexo do e-mail, onde encontraria as fotos. As fotos das mansões com 18 suites eram meramente ilustrativas. Bem que achei estranho ele chamar de Kitnet casas de 4 andares e 6.000 m². Pensei que ele estava sendo irônico. Mas não estava e era uma merda de uma kitnet cara pra caralho, sem água encanada, sem luz, onde moravam 6543 pessoas e só um banheiro para essa raça toda. Não havia pinheirinho purificador de ar que desse jeito.
O sindico do prédio era um turco e queria me cobrar “per capita” o valor do condôminio. Ou seja, teria que pagar por vaca. Tentei demove-lo dessa idéia, dizendo que as vacas eram simples animais e que ficariam ali no pastinho do lado. Acho que o pasto é o playgroud do prédio, pois ele não gostou da idéia. Falou que se eu amarrasse as vacas, ele é quem me amarraria e chamaria a policia. Esse cara é um matuto mesmo.
Acabei concordando na hora, pois precisava dar inicio aos meus planos. Esperaria aquela noite passar e abriria meu negócio e então ficaria rico e mandaria esse turco filho de uma rapariga tomar naquele lugar onde o sol não brilha. Acomodei as vaquinhas na kitnet e dormi na varandinha de 1,2 X 1,2 que tinha na sala. Acordei com uma baita dor nas costas. Aaaahhhh! que saudades da minha mansão no Brasil a beira-mar, com meus 35 empregados e minha camareira Venezuelana, a doce Conchita. Estou pensando seriamente em fazer uma proposta para ela largar o trabalho que consegui pra ela de acompanhante de executivo e vir pra cá comigo.
Comi meu café da manha, com alguns paezinhos da viajem que eu havia escondido na cueca para alguma emergência e sai em busca de um bom abatedouro para descarnar minhas vaquinhas. Como não falava a língua local resolvi me comunicar por meio de mímicas. As pessoas na rua a quem eu “questionava” por meio de sinais sobre um abatedouro, não estavam entendendo o que eu queria, pois algumas fugiam de mim como o boi da degola e outras me indicavam uma casinha pequena na beira do rio, onde morava um negão 3x2 com cara de poucos amigos. Teria eu mesmo que fazer o serviço sujo!
Aluguei um estabelecimento no centro da capital, ali meus clientes poderiam ser bem recebidos e resolvi dar uma volta na cidade. Fiquei impressionado com a população se banhando em um riozinho, um tal de “Ganges”. Resolvi fazer o mesmo para me enturmar e fazer potenciais clientes. Comprei um sabonete de glicerina e não me fiz de rogado, dei um duplo twist carpado e fiz aquela festa. A água estava uma delicia, quentinha como eu gosto. Lá pelas tantas, vi um corpo boiando, achei que era alguém se afogando e comecei a gritar por socorro, esperando que algum salva-vidas pudesse ajuda-lo. Não encontrei ninguém, entretanto, decidi ser o herói. Nadei sincronizadamente meu internacionalmente conhecido nado cachorrinho até o moribundo. Agarrei aquele homem com todas minhas forças e levei a margem. O povo me aclamava, pois todos gritavam a minha volta querendo um pedaço de mim. Como reparei que ele ainda não respirava comecei a fazer massagem cardíaca e respiração boca-a-boca. Infelizmente não consegui salvar aquela pobre alma. Faleceu em meus braços. Mesmo com todo meu intento, seu maxilar desvencilhou de seu corpo e veio parar dentro da minha boca. Então comecei a chorar: “Por que Senhor! Por que não fui eu no lugar dele. Ele não merecia morrer assim”. Finalmente Orestes chegou para acalmar minha dor e falou que aquele corpo fazia 3 meses que já estava ali. Assim me acalmei e voltei a banhar-me. Nisso a população local veio atrás de mim, querendo me linchar novamente. Tentei explicar que o rapaz já estava morto através de sinais, mas ninguém me entendia e começaram a me dar cadeiradas. Orestes me resgatou do meio do povo e me levou até meu estabelecimento comercial.
Chegando a meu humilde estabelecimento, havia 3 policiais e 1 diplomata da embaixada do Brasil me esperando. Fiquei feliz pois com certeza seriam meus primeiros clientes. Antes que eles abrissem a boca, matei uma vaca dizendo que já estava saindo uma suculenta costela. No momento em que estava carneando o gado, fui pego de supetão pela paulada do policial mais forte, que me deu com um cacete na orelha, dizendo que eu estava preso, segundo a tradução do Diplomata. Não entendi nada, será que meu alvará sanitário, vendido pelo Orestes, estava vencido?
O Diplomata se encarregou de me levar a Embaixada, onde me explicaram que lá não se come carne. Que absurdo sem tamanho! Fui levado a uma cela pequena, mas pelo menos era 3 vezes maior que minha Kitnet na Kashemira.
Confiscaram minhas vaquinhas e meus bens e fui extraditado para o Brasil, com a promessa de que nunca mais colocaria os pés na Índia ou seria levado a pena de morte por matar uma vaca. Se essa moda pega no Brasil, to ferrado.
Hoje, três meses depois do ocorrido, sou empregado de uma grande rede de Fast-Food, mas, estou muito feliz, pois fui promovido ao cargo de auxiliar de chapeiro. Um dia volto à Índia e monto a minha porra de churrascaria.

FIM

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